A capital angolana, Luanda, recebeu no último dia 19 o lançamento do livro Os “papéis” de Dom António Manuel, embaixador do Reino do Congo em Roma (1604-1608), apresentado durante a abertura da exposição “Dom António Manuel Nsaku Ne Vunda, primeiro embaixador africano acreditado junto da Santa Sé (1604-1608)”, promovida pelo Ministério das Relações Exteriores de Angola no âmbito das celebrações dos 50 Anos da Independência.

A publicação contém a correspondência inédita do embaixador centro-africano António Manuel Ne Vunda, que se encontra preservada no Archivio Apostolico Vaticano, e resulta de investigação desenvolvida desde 2022 pelos pesquisadores José Rivair Macedo, do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e Nuno de Pinho Falcão, do Instituto de Humanidades e Letras da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (IHLM-Unilab).

Na primeira parte da obra, os editores apresentam minucioso estudo das relações diplomáticas diretas do Reino do Congo com a Sé Apostólica no período de 1512 a 1622, com particular atenção na organização de embaixadas e na troca de correspondência oficial. Já na segunda parte, consta a transcrição integral dos documentos preservados no códice Miscellanea, Armadi I, vol. 91, ff. 124-254, do Arquivo do Vaticano, com notas explicativas e anotações históricas, seguida da adaptação dos 71 documentos transcritos para a língua portuguesa moderna.

Além de extensa pesquisa bibliográfica, Macedo e Falcão realizaram consultas diretas em diversos arquivos europeus: Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Archivo General de Simancas e, sobretudo, a documentação dos Fundos Borghese e Confalonieri, do Archivio Apostolico Vaticano.

O arquivo do embaixador contém sua correspondência oficial com o papa Paulo V Borghese, com o rei Filipe III de Espanha, com religiosos da Companhia de Jesus e da Ordem dos Carmelitas Descalços, além de diversas cartas trocadas com parentes e amigos que residiam em Lisboa, escritos pessoais de espiritualidade, sobre as dificuldades impostas à missão diplomática que conduziu e sobre sua situação de saúde, gradualmente agravada durante sua passagem por Portugal e Espanha. O embaixador faleceu no Palácio Apostólico do Vaticano em 5 de janeiro de 1608, tendo sido enterrado com honras no interior da Basílica Papal de Santa Maria Maior de Roma.

Ao tornar público o arquivo pessoal, os pesquisadores disponibilizam registos escritos da elite letrada centro-africana que comprovam não apenas a capacidade de adaptação do Congo ao sistema político europeu nos primeiros séculos de contato, mas demonstram a participação direta dos africanos em eventos importantes da história europeia, pelos quais se poderá reavaliar a interconexão da história da África com a história da Europa moderna.

Para Nuno Falcão, o livro ganha significado particular com o lançamento em Luanda, capital da República de Angola em cujo território, no passado, estava a sede de governo do Reino do Congo. “Sua publicação por uma editora centro-africana constitui, em certa medida, a devolução de narrativas ignoradas durante séculos. A plena disponibilização desses documentos aos pesquisadores e ao público em geral, especialmente aos povos herdeiros do Reino do Congo, possui, além do valor académico e científico, uma dimensão política, pois possibilita o acesso a informações inéditas e restitui aos descendentes do Antigo Congo novos elementos para o conhecimento de sua  história”, informa o professor da Unilab.

Serviço

MACEDO, José Rivair; FALCÃO, Nuno de Pinho (eds). Os “papéis” de Dom António Manuel, embaixador do reino do Congo em Roma (1604-1608). Luanda: Mayamba Editora, 2025, 380p. Adquira a obra no site da Editora Mayamba, de Luanda: https://mayambaeditora.com/.